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Cresce o número de famílias em tomadas de terras por todo país

Publicado originalmente por Taís Souza em anovademocracia.com.br, em 28 de abril de 2022

Em um claro sinal de desespero e medo da rebelião no campo, o presidente fascista Jair Bolsonaro, no dia 10 de março, durante suas conhecidas lives, afirmou que durante seu governo o número de ocupações de terras diminuiu. Falácia sustentada no medo que ronda não somente a ele, mas também às classes dominantes e o Alto Comando das Forças Armadas reacionárias (ACFA), que diante da inconteste luta do povo, prepara e executa operações militares de grande escala e promove terrorismo e campanhas de difamação contra o movimento camponês em meio ao avanço da já declarada guerra reacionária.

Bolsonaro mente

Tão cedo quanto possível o monopólio de imprensa reacionária e os oportunistas se alvoroçaram em reafirmar essas teses, apontando números de ocorrências registradas no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) em uma tentativa de diminuir ou então apagar a relevância e importância da luta do campesinato.

A Câmara de Conciliação Agrária do Incra, que é responsável pelo recolhimento dos registros de ocorrências, apontou apenas 11 ocupações de latifúndios no ano de 2021. Porém, além da mudança na metodologia apontada pelo próprio instituto na contabilização das ocupações – que, desde 2017, recolhe os dados através do Controle de Tensões e Conflitos Agrários (CTCA), um sistema virtual, ficando a cargo dos latifundiários passar ou não a informação sobre as ocupações – os números contrastam com a realidade revelada através de outras entidades por todo país.

Conquistar a terra, destruir o latifúndio!

Dados parciais dos conflitos agrários de 2021, trazidos à tona pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), expressam que só em 2020 o número de famílias em ocupações e retomadas teve um aumento de 558,57%, passando do número estimado de 519 para 3,4 mil famílias. O relatório contabiliza também um aumento de 3,55% das famílias envolvidas nos conflitos.

Apenas nos quatro primeiros meses de 2022, o AND apurou que houveram 16 ocupações e retomadas de terra pelo país envolvendo mais de 3,3 mil famílias camponesas, indígenas e quilombolas. Os dados indicam que ao menos 13,7 mil pessoas se lançaram às tomadas e retomadas. Essas aconteceram nos estados da Bahia, Pará, Brasília, Mato Grosso do Sul e São Paulo. 

As ocupações, em sua maioria, ocorreram em grandes áreas ociosas, que já pertencem à União, ou deveriam ser destinadas à dita “reforma agrária”, mas que ainda assim o latifúndio detém o controle sobre elas.

A CPT traz ainda informações sobre as ações de solidariedade à luta pela terra, com um dado de 382 manifestações apenas nos oito primeiros meses de 2021. Esse número representa 29,8% das “manifestações de luta” registradas, nas quais cerca de 350 mil pessoas participaram. Isso demonstra que a questão agrária e a luta pela terra como questão central da situação nacional é cada vez mais percebida e apoiada pela intelectualidade progressista, democratas verdadeiros e massas populares politicamente mais ativas.

Famílias buscam solução para a miséria imposta

As ocupações ocorrem em meio a um agravamento da situação de miséria, carestia de alimentos, aumento do índice de desemprego sobre as massas em geral, e sobre os camponeses pobres ou com pouca terra e povos tradicionais, em particular.

De acordo com o Editorial semanal de AND, intitulado Economia esfarrapada, situação explosiva, a inflação aumentou 10% no ano de 2021 e o preço dos alimentos aumentou 14%. Soma-se a esse cenário o fato de que ao menos 15,6 milhões de famílias estavam oficialmente na extrema miséria em dezembro deste mesmo ano. Já o desemprego atingiu os patamares de 26,3 milhões de pessoas (contando desempregados, desalentados e subutilizados no terceiro trimestre de 2021).

O Editorial afirma ainda que 2022 e 2023 serão anos críticos, e que tudo isso ocorre “em benefício direto e indecoroso do capital financeiro imperialista e seus lacaios internos, grandes burgueses e latifundiários” que aumentam seus lucros exponencialmente. 

As tomadas de terras do latifúndio têm sido o caminho encontrado pelas famílias que, diante desse cenário calamitoso, já não esperaram mais pelo velho Estado, que através do próprio Incra admitiu sua inércia ao declarar que somente na região da Amazônia Legal existem 120 milhões de hectares de terras públicas federais, dos quais 43 milhões ainda não foram destinadas para nenhuma finalidade. 

Assim, as massas populares são empurradas, no campo e na cidade, a tomar o destino pelas próprias mãos, criando através dos meios mais avançados e comprovados nos vastos anos de experiência do movimento camponês consciente, um caminho de combates e vitórias, dispostas a enfrentar mesmo os mais cruentos crimes do latifúndio.

Conflitos agrários e guerra civil no campo

Os dados parciais dos conflitos agrários no ano de 2021, trazidos pela CPT, expressam que a guerra reacionária, que incide sobre o povo na cidade e no campo, se escala. 

No levantamento foi registrado um aumento de 1.044% no número de assassinatos em decorrência da luta pelo direito à terra, passando de nove, em 2020, para 103, em 2021. Naquele ano houveram ao menos duas chacinas contra camponeses que tiveram repercussão nacional. Ambas em Rondônia.

Apenas entre janeiro e dezembro de 2021, foram registrados 28 assassinatos em conflitos agrários, um aumento de 30% em relação ao ano anterior. A maior parte desses crimes ocorreram no norte do país, onde os oito camponeses assassinados na Amazônia durante este período faziam parte da Liga dos Camponeses Pobres (LCP).

Ao menos 418 territórios sofreram “violência contra ocupação e a posse” pelos reacionários até agosto de 2021. Não estão contabilizados nessa categoria os crimes cometidos contra centenas de famílias nas Áreas camponesas Tiago Campin dos Santos e Ademar Ferreira no segundo semestre de 2021, os ataques de maior dimensão ocorridos naquele ano.

O relatório aponta que a maioria das ações foi promovida pelo latifúndio, classificado pela CPT como “fazendeiros” e “empresários” 41%, o velho Estado ficou a cargo de 14% das ações registradas. Segundo a CPT, em decorrência dessas ações, nesse período houve um aumento em 94% em destruição de casas, 104% em destruição de pertences, 153% em expulsão, 113% em grilagem, 118% em pistolagem e 1.057% em impedimento de acesso de áreas de uso coletivo.

No entanto, fica evidente com o crescimento do número de ocupações e de famílias envolvidas nas tomadas, que mesmo o latifúndio e seus lacaios aplicando uma ferrenha repressão e cometendo os mais desprezíveis crimes, a rebelião no campo se impõe e o povo segue lutando, resistindo e ocupando com disposição dobrada. A promessa feita pelos camponeses do Acampamento Manoel Ribeiro se concretiza também nas milhares de famílias que buscam historicamente conquistar o sagrado direito à terra: “Voltaremos mais fortes e mais preparados”.