Um ano após a retomada das terras da Fazenda Pedras de São João em Pedras de Maria da Cruz, os camponeses, organizados pelo CDRA – Comitê de Defesa da Revolução Agrária, concluíram o Corte Popular, com apoio da Liga dos Camponeses Pobres. Nesta mesma área, em 22 de outubro de 2014, foi assassinado covardemente numa tocaia, por pistoleiros e policiais à mando do latifúndio, o dirigente da LCP, Cleomar Rodrigues de Almeida.
Durante os dias 21 e 22 de janeiro, os camponeses realizaram uma grande celebração, com vibrante Ato Político no qual foram entregues a cada uma das 62 famílias, o Certificado de Posse, pelo CDRA.
Um marco histórico na luta dos camponeses
Na abertura das atividades, causando grande comoção em todos os presentes, foi cravado um tronco de aroeira, como marco ao lado de uma placa com inscrições em honra ao companheiro Cleomar, na entrada da cancela, onde o companheiro fora assassinado. Um segundo marco foi fixado em frente à sede da Associação das famílias, que também é sede da Escola Popular, na Vila “Unidos com Deus Venceremos”, onde o companheiro foi um dos fundadores e vivia com sua família.
Os familiares do companheiro Cleomar estiveram presentes. Durante a colocação do marco de honra, seu pai retirou solenemente um singelo pano vermelho que cobria a placa, seguido de aplausos de mais de 130 pessoas, entre as quais muitas verteram suas lágrimas pela lembrança do companheiro Cleomar e de ódio ao crime cometido pelo latifúndio. Após ser cantado com especial vigor, o “Conquistar a terra”, seguiram alguns pronunciamentos, com juramentos de vingar o sangue derramado do companheiro através do prosseguimento da luta por conquistar a terra e destruir todo latifúndio. Também pronunciou com emoção, a viúva do companheiro, afirmando que nunca conhecera uma pessoa com tamanho valor.
As organizações presentes saudaram o CDRA pela conclusão do Corte Popular e declararam seu apoio à luta dos camponeses. Cada uma, a seu modo, fez sua homenagem ao
Ao longo de todo ato de colocação do marco e no encerramento, ouviram-se em coro várias palavras de ordem como: “é terra, é terra, pra quem nela trabalha, e viva agora e já a Revolução Agrária!” “É morte, é morte, ao latifundiário, e viva o poder camponês e operário” “Viva a aliança operário-camponesa” “Companheiro Cleomar: Presente na Luta” “Companheiro Renato: Presente na Luta”, “Viva a Revolução Agrária!” e várias outras consignas que demonstraram a disposição e vivacidade dos companheiros e companheiras.
A festa
Antes e durante a festa, era visível a euforia da juventude que se preparava nos intervalos entre uma atividade e outra, para a apresentação de uma peça teatral, proposta pelo “Grupo de Teatro Servir ao Povo” (Varzelândia).
No sábado à noite, como não poderia faltar, teve uma bela roda de viola com uma dupla, formada por filhos dos camponeses que surpreenderam a todos com suas belas vozes e sua destreza na viola e violão. Para abrilhantar a festa e garantir melhores condições de segurança, a autodefesa colocou diversas tochas, no percurso da cancela até a roda de música, iluminada por uma fogueira central.
Além disso, mesmo sob um sol escaldante, foram realizadas atividades recreativas, como futebol, peteca, brincadeira com as crianças, tudo num clima de muita união e companheirismo.
Apoiar-se nas próprias pernas
É importante ressaltar que, nas vésperas e durante os dois dias de festa, funcionou com ótima organização a Cozinha Coletiva. As refeições foram servidas sem nenhum atraso e com ótima qualidade. Desde o café da manhã, os almoços com churrasco, arroz com pequi e os jantares com caldo de mandioca e costela de boi, tudo, tudo muito bem caprichado, da água aos locais para receber os visitantes, cada detalhe foi pensado pelos companheiros e companheiras. Muitos trabalharam duro para que tudo desse certo, toda a área se renovou. A equipe de propaganda trabalhou pesado, a juventude se mobilizou e a área estava a própria expressão da grandeza do momento, com flores, cartazes e faixas por todo lado que se olhava. Também a equipe de autodefesa trabalhou bem. O clima era de festa, mas também de tensão. Na quinta a policia civil invadiu a área pela mata, nos dias seguintes DRONES sobrevoaram as casas. Os companheiros responsáveis mantiveram a vigilância por todo o momento. Tentaram acertar os DRONES mas não tiveram sucesso.
Movimento Feminino Popular
Na reunião, todas se pronunciaram. Estavam presentes mais de 30 companheiras, entre camponesas, estudantes, professoras, pesquisadoras, sindicalistas e outras trabalhadoras da cidade. Com falas simples cada uma se apresentava e falava o que pensava da luta, da situação atual em nosso país e como se sentia naquele momento. Vários relatos demonstraram a importância da participação das mulheres em todas as atividades, em especial na retomada daquelas terras e na realização e sustentação do Corte Popular.
Durante a reunião, os companheiros cuidaram das crianças, realizando atividades com elas para que as mães pudessem participar. Além disso, outra equipe de companheiros se revezaram na cozinha, para que nenhuma companheira ficasse de fora.
Servir ao Povo
O grupo de teatro Servir ao Povo preparou junto à juventude local a apresentação da peça “A Aldeia Tachai”, uma adaptação de parte dos “Três textos mais lidos do Presidente Mao Tsetung”.
Alguns membros do grupo de teatro original já haviam se dispersado, indo morar em cidades diferentes e as companheiras tinham agora à sua frente o desafio de envolver novos companheiros que em sua maioria sequer já assistiram uma peça de teatro e que conheceram a peça poucos dias antes de apresentá-la. Além disso, os “atores” cresceram, e os figurinos estavam muito pequenos e apertados. Tudo isso superado, o desafio seria apresentar.
Durante a apresentação, o barracão da Assembleia Popular ficou pequeno, e ao redor se amontoaram as pessoas para ver a apresentação teatral. O silencio na “plateia” e a atenção eram incomuns e todos os personagens puderam ser ouvidos, mesmo os iniciantes. A apresentação causou grande impacto nos presentes, em especial nos camponeses, pelo orgulho de ver o esforço de seus companheiros e filhos defendendo sua luta, pela identidade com a aldeia Tachai, em função da seca severa que assola o Norte de Minas e grande parte da Bahia e pela alegria de ver representada a vitória dos pequenos e explorados sobre os inimigos do povo.
A entrega dos Certificados de Posse
Este era o momento mais esperado da festa. Momento em que cada família receberia das mãos do Comitê de Defesa da Revolução Agrária, o seu CERTIFICADO DE POSSE, constando o seu nome (do casal), o numero do seu lote, o tamanho, as coordenadas geográficas e o mapa, como reconhecimento de sua luta pela conquista da terra e de seus esforços para defendê-la sob a bandeira da Revolução Agrária.
A cada pronunciamento, aumentava o fervor e a fé na luta. A declaração da juventude combatente que atua nas cidades fez encher de certeza e esperança de que nossa luta está no caminho certo, que muitos jovens e intelectuais honestos se unirão aos camponeses pobres por entenderem que esta é a contradição principal em nosso país e que a Revolução Agrária abrirá o caminho para a construção de uma nova e verdadeira democracia no Brasil.
A ansiedade crescia em torno da entrega dos certificados, quando todos os membros do CDRA foram chamados a frente para a tão esperada hora. Antes, uma carta da Comissão Nacional das Ligas foi lida, na qual saudava o CDRA e todas as famílias pela vitória que representava este momento e chamava a atenção para a gravidade da situação política, os ataques sofridos pelo movimento camponês, quilombola e indígena em todo o país, especialmente em Rondônia, pela ação conjunta dos bandos armados dos latifundiários e o velho Estado e seus agentes repressivos, contando com uma campanha difamatória contra a LCP pela atuação venal da imprensa rondoniense, serviçal do imperialismo e dos latifundiários.
Por fim, cada família foi chamada em alto e bom som a frente e recebia orgulhosamente o seu certificado. A cada certificado entregue, aplausos calorosos de todos os presentes! Muitos se emocionavam. O clima era de união e muito orgulho. O companheiro Cleomar está ainda mais vivo, cada vez mais, presente em nossa luta!
Viva o Corte Popular!
Viva a Assembleia Popular!
Viva o Comitê de Defesa da Revolução Agrária!
Viva a Área Revolucionária Cleomar Rodrigues!
Cleomar Vive! Morte ao latifúndio!
Viva a Revolução Democrática-agrária e anti-imperialista!
Liga dos Camponeses Pobres do Norte de Minas e Sul da Bahia