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Camponeses da área Canaã se preparam para resistir à ameaça de despejo em Ariquemes

As mais de 100 famílias que residem e produzem há 17 anos na área Canaã, no município rondoniense de Ariquemes, há 210 Km da capital Porto Velho, foram surpreendidas às vésperas das comemorações natalinas por mais uma descabida ameaçada de despejo, em meio ao ascenço da segunda onda de contaminação da pandemia da Covid-19.

A criminosa decisão de expulsar as famílias das terras que vivem e cultivam foi cometida no dia 14 de novembro pela 2ª Unidade de Conflitos Agrários de Porto Velho/RO que determinou o despejo forçado de todos os ocupantes do local.

A grave denúncia foi feita por advogados populares que acompanham a situação da luta pela terra na região.

Em nota, os advogados do povo alertam sobre a ilegalidade da decisão que ignora o fato de que, juridicamente, o latifúndio ocupado está sob o domínio da União e não mais dos latifundiários ladrões de terra: “há uma questão que pode ser facilmente compreendida: há uma decisão liminarmente proferida nos Autos da Ação Civil Pública n° 1010772-92.2019.4.01.4100, que corre da Justiça Federal, interposta pelo Ministério Público Federal em desfavor dos fazendeiros que se dizem proprietários do imóvel e do INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), que determina o BLOQUEIO da matrículas de registro de imóvel bem como a SUSPENSÃO dos efeitos dos Contratos de Alienação de Terras Públicas (CATPs), que são nada mais e nada menos do que a origem da titulação do imóvel em nome dos fazendeiros. Tal decisão implica no fato de que, uma vez suspensos os efeitos destes CATPs, o imóvel deve regressar ao domínio da União, sendo comprovadamente terras públicas, que devem ser destinadas a Reforma Agrária, como prevê a nossa Constituição Federal.”

Os defensores do povo asseveram que: “O fato concreto é que os CATPs não cumpriram as cláusulas resolutivas e o INCRA adia qualquer intervenção jurídica para dar ao imóvel a destinação correta: assentar famílias que queiram viver e produzir na terra.”

Como bem destacam os advogados populares, a arbitrária e descabida ameaça de reintegração prejudica não só as centenas de famílias trabalhadoras da área, mas também as regiões od entorno que são abastecidas pela produção camponesa da área Canaã [ou de Canaã]: “As famílias produzem e abastecem o mercado alimentício das cidades vizinhas, tornam a terra produtiva e garantem o cumprimento da sua função social, concretizando sua posse por todo esse tempo, ao passo que o fazendeiro nunca residiu na área e portanto nunca sequer teve a posse do imóvel. E como já foi comprovado na esfera jurídica, também não é o legítimo proprietário.”

Camponeses e apoiadores fazem a colheita do arroz

Os defensores do direito do povo apontam ainda que, com essa decisão, mais uma vez o poder judiciário “trata a propriedade privada como o bem mais precioso a se guardar e proteger, em detrimento da vida humana, da alimentação, da moradia.” E completam: “Mais uma vez o Poder Judiciário desvirtua-se de suas funções e ao invés de garantir direitos básicos como moradia, segurança e a própria vida, preza pela propriedade privada e pela continuidade do poder devastador que tem o latifúndio e o agronegócio. Passa por cima de princípios basilares do nosso ordenamento jurídico para garantir que o acesso à terra continue sendo apenas para quem pode pagar, sob argumentos novelescos e na contramão de qualquer tentativa de uma sociedade justa e menos desigual.”

Se por um lado o ano que está por vir traz aos camponeses e camponesas da área Canaã grandes riscos, frente à grave ameaça de despejo da Polícia de Ariquemes, uma das mais violentas do Estado e que não medirá esforços para cumprir ordem judicial arbitrária e injusta, por outro lado, traz a certeza de que somente a organização e a luta poderão continuar a garantir-lhes a vitória, como têm sido ao longo dessas quase duas décadas em que vivem e produzem sobra estas terras.