Reproduzimos abaixo matéria publicada no portal de notícias A Nova Democracia em 04 de fevereiro de 2025.
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Território quilombola foi incendiado por latifundiários. Foto: Reprodução/Rádio e TV Quilombo
Latifundiários cometeam novos crimes contra camponeses entre o final de janeiro e início de fevereiro de 2025. Mais de 135 famílias camponesas que residiam há quatro meses na ocupação Marielle Franco, na zona leste de Teresina, Piauí, foram despejadas por uma operação da Polícia Militar em conluio com pistoleiros. No Maranhão, pistoleiros a soldo do latifúndio invadiram o território quilombola Cancelas, em São Benedito do Rio Preto, e destruíram e incendiaram as plantações. No Acre, camponeses encontraram o corpo do camponês José Jacó Cosotle, de 55 anos, morador de uma ocupação também nomeada Marielle Franco.
Violento despejo no Piauí
O Comitê de Solidariedade à Luta pela Terra (COMSOLUTE) relatou que o despejo no Piauí ocorreu sob ordem da 5a Vara Cível da Comarca de Teresina, que atendeu “aos interesses da Cooperativa Mista dos Avicultores do Piauí (Coave)”.
Nota Comsolute 25/01/25: https://anovademocracia.com.br/wp-content/uploads/2025/02/NOTA-COMSOLUTE-25-1-31.pdf
O governo do Piauí, de Rafael Fonteneles (PT-PI), mobilizou a Polícia Militar, a cavalaria e a tropa de choque contra as famílias. Outros 20 pistoleiros contratados pela empresa também participaram da operação. Os sicários não deixaram as famílias recolherem seus pertences e destruíram as casas com o uso de tratores. Segundo o COMSOLUTE, moradores que tentaram recolher seus bens durante a demolição foram ameaçados de atropelamento pelos condutores dos tratores.
A terra foi destinada à Coave, apesard as famílias defenderem que a empresa só possui 50m² na área. A ocupação Marielle Franco foi erguida em 2024 no terreno que estava abandonado há mais de 40 anos.
“Este ato evidencia, mais uma vez, a aliança entre o poder judiciário, forças policiais e interesses privados em detrimento dos direitos do povo. Em benefício do latifúndio, cada folha de grama consta como propriedade pessoal e inviolável, enquanto que para os camponeses, nenhum de seus pertences merece proteção”, disse o COMSOLUTE, em nota. “Acontece no campo e na cidade, no Maranhão, no Piauí e em todo o país: a conivência do Estado com o latifúndio, inclusive em contexto urbano, unifica forças para esmagar a organização dos trabalhadores, pais e mães de família”.
Pistoleiros atacam quilombolas no Maranhão
No Maranhão, pistoleiros incendiaram as plantações e outras áreas de um território quilombola em Cancelas. O incêndio atingiu mais de mil hectares de mata, segundo informações dos moradores repercutidas pela Rádio e TV Quilombo.
Os pistoleiros já haviam tentado expulsar os quilombolas na semana retrasada. Eles chegaram com 14 tratores e correntões para desmatar a região. Cerca de 70 quilombolas se colocaram na frente dos veículos e conseguiram expulsar os invasores.
O Centro de Defesa dos Direitos do Povo Pe. Cláudio Bergamaschi e o Fóruns e Redes de Cidadania do Estado do Maranhão denunciaram o despejo ilegal e o uso do fogo contra o povo pobre do campo. “O episódio em Cancelas não é um ato isolado, as queimadas tem sido uma estratégia de grilagem de terra em todo o país”, diz a nota. “Vale lembrar que neste mesmo município, São Benedito do Rio Preto, fica a comunidade Baixão dos Rochas, que enfrentou um despejo ilegal em 2023. À época, a comunidade foi invadia no período da noite, destruíram suas plantações, as residências, casas de farinhas, mataram os animais, roubaram os alimentos, além das torturas físicas e psicológicas aos moradores que até hoje sofrem as consequências.”
O documento também denuncia a hipocrisia e o caráter de classe dos governadores de turno. “Ironicamente, o Ministro da Suprema Corte Judicial Brasileira, Flávio Dino, ex-governador do estado do Maranhão, estabeleceu, na última semana, prazo para que as unidades federativas que compõem os biomas Amazônia e Pantanal apresentassem os seus planos de combate aos incêndios. No entanto, o Ministro, enquanto governador, entregou as terras maranhenses nas mãos dos latifundiários, principais envolvidos nas queimadas criminosas, tendo como principal facilitador, seu vice na época, Carlos Brandão, que é hoje o atual governador e responsável pela nova lei de terras que facilita a grilagem para entregar o restante das terras públicas aos latifundiários.”, diz a nota.
“O Governo de plantão já deixou claro de qual lado está nesta guerra. Estar com os latifundiários e grileiros!”, concluem eles.
Sangrentos conflitos em Amacro
No Acre, o camponês José Jacó Cosotle foi encontrado morto no dia 29 de janeiro, segundo informações da CPT Regional Acre. O camponês, morador da ocupação Marielle Franco, foi encontrado na entrada de uma área de colheita de castanhas com um tiro no queixo. Ele esperava um amigo para coletar as sementes.
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Camponês assassinado na região de Amacro. Foto: Reprodução
“A região é palco de um sangrento conflito entre o pecuarista que alega ser dono das terras e as famílias de trabalhadores rurais ocupantes. Segundo relatos, houve inclusive a presença de segurança armada dentro da propriedade, para intimidar os posseiros.”, denuncia a CPT.
As terras já foram declaradas como griladas e devolutas à União pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). Mesmo assim, o governo se recusa a entregar as terras aos camponeses e permite que os latifundiários imponham terror ao povo pobre na região.
A região do Amacro (Amazonas, Acre e Rondônia) concentra um espantoso número de crimes por parte dos latifundiários. No dia 14/1, o camponês Francisco do Nascimento de Melo foi assassinado por um latifundiário na cidade de Boca do Acre (AM). Francisco foi assassinado por tentar proteger seu filho, que entrou em uma discussão com o latifundiário.
Na região próxima de Lábrea, sul do Amazonas, famílias da comunidade Dorothy, formada por extrativistas, denunciam que tem sofrido constantes ameaças e perseguições por parte de pistoleiros ligados a um latifundiário da região.
Chamado à autodefesa
É contra essa realidade de crimes impunes que a Liga dos Camponeses Pobres (LCP) tem chamado, nos últimos anos, os camponeses, indígenas e quilombolas a responderem através de “grupos armados de autodefesa”, como disse um comunicado da organização de 2023.
No ano passado, o movimento reafirmou o chamado, com uma nota que dizia “já em 2023, numa declaração pública, alertamos os camponeses de todo o País e os conclamamos a defender seu direito à terra de armas nas mãos.