Gesulino Castro e a impunidade dos crimes do latifúndio

Luta camponesa


Em agosto de 2025, a defesa de Gesulino César Travagine Castro, chefe da pistolagem de Rondônia, apresentou um embargo contra decisão anterior do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que manteve a condenação de Gesulino de mais de 35 anos de prisão pelo crime de homicídio qualificado por ser ele o mandante da Chacina de Buritis, episódio que culminou no assassinato de seis pessoas em 2012. Assim, a Corte Especial do STJ, em sessão virtual programada para ocorrer entre os dias 3 e 9 de setembro de 2025, julgará o recurso da defesa, que alega falhas na decisão anterior. O processo está sob relatoria do bolsonarista Nunes Marques.

Decorridos 13 anos deste crime hediondo e de inúmeros outros cometidos a serviço do latifúndio, o judiciário corrupto do Estado de Rondônia realizou centenas de manobras jurídicas em concertação com os advogados de Gesulino e o Ministério Público de Rondônia, de modo que existem centenas de recursos, embargos e vícios processuais que permitiram adiar por mais de década a execução da sentença e a manutenção do réu em liberdade para seguir cometendo crimes. Ainda que cinicamente o chefe da pistolagem busque promover ações de caridade para melhorar sua imagem na opinião pública, inclusive com objetivo de pleitear cargo político, os camponeses pobres de Rondônia conhecem muito bem Gesulino e a quem ele serve, o latifúndio.

Quanto à Chacina de Buritis, o próprio Gesulino é réu confesso. Ele planejou minuciosamente a emboscada contra compradores de gado e segundo seu próprio depoimento ele deu a ordem para o seu bando, composto por 5 pistoleiros, abordarem os ocupantes de um veículo. Quando os pistoleiros começaram a atirar, ele fugiu do local e se escondeu na sua residência, em Buritis. Ele relatou ainda que sua mãe comprou todo o armamento, passou para o bando e depois do crime, as armas foram jogadas dentro de um rio, em Ariquemes. Na época, as equipes do Corpo de Bombeiros se deslocaram para o local e encontraram várias espingardas calibre 12, revólveres, pistolas e um colete à prova de balas, comprovando a materialidade de seu depoimento.


É mera coincidência que o início da trajetória de impunidade de Gesulino coincida com o momento em ele foi alçado a chefe da pistolagem a serviço do latifúndio na região de Buritis? É coincidência que isso tenha ocorrido exatamente quando o comando da Polícia Militar na comarca de Buritis era exercido pelo pau mandado do latifúndio Régis Braguin, à época tenente, hoje coronel e comandante da Polícia Militar de Rondônia? Régis Braguin ordenou tentativa de chacina contra camponeses no último dia 8 de agosto, véspera dos 30 anos da Batalha de Santa Elina, resultando na execução covarde de um morador da área Valdiro Chagas, o camponês Raimundo Nonato. Vários camponeses testemunharam ao jornal Resistência Camponesa que os pistoleiros de Gesulino, incluído o próprio e seu principal comparsa, Diógenes Gonçalves Costa, atuaram mascarados junto com as tropas sanguinárias do BOPE.

O jornal Resistência Camponesa publicou a ficha corrida de Gesulino, na qual constam inúmeros crimes cometidos nos últimos anos, como os assassinatos de dirigentes da luta pela terra na região de Rio Crespo e Cujubim. Em abril de 2025, Gesulino e seu comparsa da pistolagem Diógenes, que também tem extensa ficha criminosa incluindo agressão de ex-esposa e falta de pagamento de pensão, expulsaram as famílias camponesas da área revolucionária Gedeon José Duque e há meses estão investindo contra as famílias das áreas revolucionárias Valdiro Chagas e Gonzalo 1 e 2, cometendo toda sorte de abusos, torturas, tentativas de homicídio, humilhações, ameaças (inclusive de crianças), destruição de lavouras e casas, incêndios criminosos, além da atuação paramilitar em apoio ao BOPE no dia 8 de agosto.

Na maioria das vezes, Diógenes Gonçalves Costa é quem dá as caras diretamente, com Gesulino agindo com rosto coberto para não colocar a perder a imagem de “bom moço”, principalmente nas redes sociais. Mas desde que chegou, em abril, ele tem gerenciado pessoalmente seu bando. Inclusive, recentemente, Gesulino apareceu com o próprio veículo para cometer incêndios criminosos, como flagrado por camponeses e simultaneamente pelo sistema de alertas do Google nos últimos dias.


À esquerda, fotos da caminhonete de Gesulino Castro e sua placa, em dia de incêndio criminoso na área Valdiro Chagas. À direita, alerta de incêndio na área Valdiro Chagas.

Em abril de 2025, após expulsar as famílias da área Gedeon Duque com seu bando de pistoleiros, Gesulino também iniciou um processo de desmatamento de uma área de mais de 10 km² de mata nativa que pertenciam à área ocupada pelas famílias de posseiros, e o fez sob a conivência dos órgãos ambientais, que receberam diversas denúncias do desmatamento ilegal, mas não agiram.

Antes e depois da expulsão das famílias que viviam na área Gedeon Duque, respectivamente imagens de 2024 e de julho de 2025. A imagem a direita mostra a área de mata nativa derrubada e parcialmente queimada, com estradas recém-construídas. As imagens acima foram enviadas ao Ibama numa denúncia anônima também enviada ao jornal Resistência Camponesa.
Imagem do dia 1º de setembro, que mostra a Área Gedeon Duque totalmente desmatada e queimada.

Com a certeza da impunidade, Gesulino não esconde os crimes que comete, e os publica em suas redes sociais, com provocações aos camponeses da área Valdiro Chagas. Em vídeo recente, em que aparece com Diógenes Costa e outros comparsas, o grupo comemora mais um ataque realizado na área Valdiro Chagas. Um dos celerados, Rafael Milani Salgado, chega a pronunciar a frase “o risco que corre o pau corre o machado” e logo em seguida morde e mastiga um pedaço de isopor (!).

À esquerda, o pistoleiro e covarde agressor de mulheres, Diógenes Gonçalves Costa. Ao centro e à direita, Rafael Milani Salgado, também comparsa de Gesulino Castro.

Em suas redes, Gesulino se vangloria da alcunha de chefe da pistolagem e faz questão de exibir armas e simulacros em seus vídeos. Em seu aniversário, anos atrás, chegou a fazer uma festa com o tema faroeste, colocando um cartaz seu com a palavra “recompensa-se” e com sua filha apontando uma arma de brinquedo para ele. Suas filhas são constantemente utilizadas em seus vídeos para passar a imagem de “pai de família”, quando na verdade são exploradas em competições de equitação em diversos eventos de Rondônia. Através das páginas do instagram @gesulino.castro_faz4.marcos e @marina_yamashita é possível acompanhar a exaustiva rotina de trabalho de suas filhas, todas menores de idade.

À esquerda, filha de Gesulino aponta arma de brinquedo para o pai. À direita, Gesulino mostra em vídeo um desenho de uma arma com as inscrições “Gesulino – Afaste Perigo” afirmando que esse é o jeito certo de reservar uma mesa num bar.

Os 13 anos de impunidade só foram possíveis com a conivência e atuação ativa de um judiciário corrupto que utilizou de diversos artifícios jurídicos para mantê-lo em liberdade. Seria razoável supor que caso a sentença de Gesulino seja confirmada pelo STJ e se torne definitiva, a execução da pena seja aplicada imediatamente, mas diante da suspeita atuação do judiciário e do Ministério Público todos esses anos, os camponeses pobres de Rondônia duvidam muito. Diante de fartas provas de crimes anteriores e de novos que seguem a ser cometidos todos os dias por Gesulino Castro, restam diversas dúvidas sobre até quando o sistema judiciário brasileiro deixará um assassino sanguinário a solta. Se os crimes de Gesulino fossem devidamente investigados, sua pena de 35 anos seria considerada extremamente branda.

Camponeses denunciam que Gesulino está tentando fazer dentro das áreas Gedeon Duque, Valdiro Chagas e Gonzalo 1 e 2 é o mesmo que ele já fez na área Bacuri, onde assassinou o dirigente camponês Cristiano e tentou assassinar outro camponês. Com isso, ele realizou a expulsão de dezenas de famílias a serviço do latifúndio local. Como prêmio pelo serviço prestado, Gesulino ganhou terça parte da área Bacuri, onde hoje tem a sua fazendinha (“haras”) para lavar o dinheiro da pistolagem. Na própria área Valdiro Chagas, antes Fazenda Jatobá, é de conhecimento da maioria dos camponeses que Gesulino matou um casal a mando do filho do homem que se dizia dono de tal fazenda.

Gesulino se gaba de que tudo o que conquistou foi com trabalho. Seria esse o trabalho de pistolagem prestado ao latifundiário e madeireiro Chaules Pozzebon, condenado a 99 anos de prisão, conhecido por ser o maior desmatador do Brasil e cujo grupo de pistoleiros matou dezenas de pessoas na região do Vale do Jamari e no Soldado da Borracha, onde por acaso Gesulino também tem terras? A lista de crimes de Gesulino nunca investigados, muitos sequer denunciados pelo MP de Rondônia, é extensa e está diretamente associada ao carniceiro Coronel da PM Régis Braguin, afinal, como já é sabido pelos camponeses há muito tempo, Braguin e Gesulino são membros do mesmo grupo de extermínio a serviço do latifúndio.