Camponeses levam a verdade para reunião do COPAM na Unimontes – Montes Claros

No dia 10 de agosto, os camponeses do Acampamento Trevo – Porto Agrário, município de Juvenília, no extremo Norte de Minas Gerais, após saberem das tramas para decretarem a fazenda Tábua/Dois Rios como Reserva Ambiental, chegam de surpresa em reunião do COPAM – Conselho Estadual de Meio Ambiente e questionam a votação que indeferiu em abril a licença ambiental para implantação do Projeto de Assentamento e decidiu pela criação de uma Unidade de Conservação Ambiental.

Pela primeira vez, os camponeses tiveram a oportunidade de ficar frente a frente com os conselheiros do órgão que  decidiram,  tendo somente um  voto contra, pela expulsão das famílias do Acampamento Trevo e outras centenas que estão em terra que margeiam o Rio Carinhanha que divide Minas/Bahia.

A reunião foi a 63ª Reunião Ordinária realizada dentro da Unimontes em que a questão não estava em pauta, mas os camponeses que viajaram 400km chegaram mais cedo e se inscreveram para falar. Depois de um dia inteiro aguardando a oportunidade certa, os companheiros que estavam com uma delegação de 5, sendo 3 do acampamento, um geógrafo e professor que mora na Vila e 1 funcionário da prefeitura, receberam apoio do Movimento estudantil , do núcleo operário da Liga Operária e de outra delegação de camponeses do Acampamento Bandeira Vermelha de Montes Claros.

Encorajados pelas mais de 200 famílias do acampamento e pela demanda dos 2000 moradores da Vila Porto Agrário que há 40 anos se encontram encurralados e cativos do latifúndio e que com a Revolução Agrária e as terras nas mãos dos camponeses receberão enfim sua carta de alforria, dois companheiros tomaram firmemente a palavra, deixando surpreendidos alguns conselheiros do copam.

O objetivo dos camponeses era reverter a situação a seu favor, já que devido a intervenção do conselheiro da Fetaemg que entrou com recurso contra a votação de abril, a questão ainda seria revista, portanto este momento foi decisivo para enquadrar as posições mais atrasadas e pró-latifundiárias e esclarecer os conselheiros que não conheciam toda a verdade sobre o processo.

Há uma articulação do latifúndio para regredir o processo legal de “assentamento” à estaca zero e tomar as terras de volta, pois se a licença é negada, o INCRA desiste da desapropriação e a fazenda volta legalmente para o latifundiário Nilo Coelho, que receberia ainda uma indenização pelo período que ficou sem as terras, até que a questão ambiental fosse completamente resolvida para criação da Reserva Ambiental, o que provavelmente não ocorreria.

Os camponeses declararam nesta reunião o que já é uma decisão tomada e firmemente cumprida pelas famílias na área: a não retirada da fazenda, a defesa do Corte Popular e da produção, com a expulsão do latifúndio, luta contra semi-feudalidade, o trabalho escravo e todas as formas de exploração praticadas contra aquele povo.

Um dos companheiros levando em suas mãos o relatório de viabilidade ambiental, assinado pelo incra, disse, após relatar a situação legal da área: “Meus senhores conselheiros, depois de todos estes procedimentos legais cumpridos para criar o assentamento, depois de sangue corrido e eu não quero que isso ocorra novamente, se negarem a licença terei certeza que vivemos numa burocracia e não numa democracia e o Brasil que é um país de 3º mundo irá se tornar um país de zero mundo!”

“Porque é o trabalhador rural que coloca o arroz e o feijão na mesa do povo brasileiro e não o latifúndio!”

Depois de contar a história de Porto Agrário e do Acampamento afirmou: “Sei que os senhores votaram sem saber destes detalhes, mas que agora estão esclarecidos, nós não viemos aqui antes porque nunca ficamos sabendo, pois decidem e depois é que somos sabedores, mas agora vocês podem saber também que lá, em Porto Agrário, tem um povo, seres humanos, que não somos contra a natureza, que defendemos onde  moramos e que ninguém  queira que nós vire bicho!”

“Não viemos aqui hoje para brigar, viemos na amizade e faço um apelo para que os senhores reflitam melhor sobre esta decisão e que no futuro os senhores não se arrependam, pois nós não vamos sair da terra!”

Uma companheira tomou a palavra desmentindo as acusações feitas aos camponeses na ata de abril e denunciando a ação do latifúndio, desmontou várias alegações que usaram para justificar a negação da licença e a criação da Reserva ambiental, disse que tudo que o companheiro havia dito era verdade. Foi feita uma pergunta sobre toda esta situação: como os camponeses irão sobreviver sem esta terra?

Após a fala dos dois companheiros que durou mais de 20 minutos, um dos conselheiros quis questionar, dizendo que esteve na área e que viu um caminhão de carvão em que  o  motorista falou que estava vindo da Vila e que teve informações que lá tinham só 30 barracos.

A companheira respondeu que passar um caminhão não significa produzir carvão, pois lá tem uma estrada e que lá nunca se produziu carvão e que qualquer um pode ir e ver que não existe, nem ao menos derrubado, sequer um forno de carvão, que isso provava como as informações recebidas por eles estavam distorcidas para incriminar os camponeses.

A diretora geral da SUPRAM, que presidia a mesa junto com a presidente do COPAM, tomou a palavra encerrando o debate e dizendo que agradecia  a presença da comunidade, que queria registrar o respeito à opinião deles e que a questão não estava totalmente resolvida e que tudo isso seria levado em conta, que os camponeses poderiam comparecer à próxima reunião que decidirá definitivamente sobre o processo.

Ao final a delegação e apoiadores fizeram vários contatos e receberam alguns compromissos de voto favorável. Alguns conselheiros foram cumprimentá-los e dizer que deram uma aula. Missão cumprida os camponeses viajaram de volta, com a cabeça erguida e uma certeza na mente: “Nossa força vem de que nossa causa é justa e que da nossa união virá a vitória”.

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