Como de costume, vieram sem nenhum aviso prévio, na verdade antes da data que havia sido marcada anteriormente. Foi improvisada uma pequena reunião e numa atitude extremamente arrogante Carlino Lima começou afirmando que só ele iria falar. Em sua falação ficou exaltando os benefícios do Incra, créditos e outras promessas mais. Afirmou que agora ele e o Incra é que eram os donos das terras da fazenda Santa Elina, que foi comprada com dinheiro do tesouro nacional. Só esqueceu de falar que o povo é o legítimo dono desse dinheiro arrecado de impostos, e que com a desapropriação da fazenda enriqueceu ainda mais o latifúndio.
Na sua falação também colocou os critérios do Incra para adquirir um lote, o tal perfil da “reforma agrária”. Afirmou que iriam fazer um “pré-cadastro” e quem não passasse no perfil seria excluído e mesmo quem passasse deveria sair das terras, acampar no Incra em Colorado do Oeste para fazer o cadastro e só então iria ser resolvido quem iria ser ou não “assentado”.
Na verdade toda essa estória de cadastro esconde a real intenção do Incra que é despejar as famílias que vivem e trabalham na área Zé Bentão e Maranata. O que eles querem é colocar outras pessoas no lugar das famílias que há tanto tempo estão lutando dentro da área. Nesses cadastros só é aprovado quem os funcionários do Incra quiserem.
Quando foi perguntado o que fariam as famílias que não tinham pra onde ir, a ouvidora agrária Marcia respondeu friamente que cada um voltasse para onde veio com uma mão na frente e outra atrás. Nem pra fazer demagogia sequer colocaram a possibilidade de outra terra.
Nessa mesma reunião, mais uma vez o Incra e em especial a ouvidora agrária Márcia, mostraram como jogam sujo e se utilizam de muitas artimanhas para enganar o povo inclusive a mentira mais descarada. Disseram que iriam passar uma lista para registrar a presença na reunião. Porém a “inocente” lista da Márcia era para uma “desocupação pacífica do imóvel para posterior assentamento”.
Incra usa polícia para intimidar e ameaçar camponeses
O coronel da polícia militar, Marcio Araújo Pinto, em sua falação afirmou que ele tinha o “sonho de ver as pessoas conquistarem um pedaço de terra para serem assentadas”. Isso não é sonho, já é realidade, hoje mais de 300 famílias vivem e trabalham em seus lotes há mais de 1 ano, e se a proposta do Incra for posta em prática esse sonho vai ser destruído.
Há um ditado popular muito justo que diz: “quem bate esquece, mas quem apanha não esquece nunca”. Para quem assassinou trabalhadores a sangue frio inclusive uma criança de 7 anos, pra quem humilhou, espancou e torturou, esquecer o passado pode ser muito fácil. Mas para quem viu seus parentes e companheiros serem assassinados, para quem sofreu todo tipo de humilhação e abuso, pra quem viu gente sendo cortada de moto-serra, viu gente sendo obrigada a comer cérebro humano, para quem apanhou e foi brutalmente torturado tendo até hoje seqüelas físicas e psicológicas, para quem foi preso e sofreu perseguições como é possível simplesmente esquecer tudo isso? Essas coisas não se esquecem jamais! Ainda mais quando os mandantes e executores dessas ações odiosas e criminosas nunca foram punidos.
O coronel ainda teria dito que hoje os policiais são outros e agem de forma diferente daquela época. Realmente mudaram alguns personagens, mas a história continua a mesma.
O coronel também afirmou que a polícia age primeiro pacificamente e depois usa a força militar. É impossível não lembrar dos acontecimentos de 1995. Quem estava na fazenda Santa Elina naquela época lembra que um dia antes do massacre (8 de agosto), a polícia através do major PM Ventura garantiu que não haveria represálias por parte dos policiais, porém o resultado da ação policial no dia seguinte todos sabemos qual foi.
Os camponeses não vão abandonar suas posses
Já são mais de 16 anos de luta e todo esse tempo o povo só viu enrolação, enganação e falsas promessas por parte dos órgãos do velho Estado. Só depois que o povo cansou de esperar e começou a aplicar a Revolução Agrária, conquistando a terra, cortando a terra, produzindo em cima dela e se organizando para resolver seus problemas, aí que o Incra apareceu. Muitas famílias tinham ainda um restinho de esperança que o Incra iria finalmente acertar uma conta histórica regularizando o corte já feito pelos camponeses e terminar de cortar o restante da fazenda Santa Elina. Porém ao invés de terra o povo só tem ganhado repressão. Basta ver como várias áreas estão sendo despejadas com participação ativa do Incra e da ouvidoria agrária, como o caso recente da área Barro Branco em Chupinguaia onde as famílias foram despejadas da área e nem na estrada puderam ficar acampadas.
O Incra e a ouvidoria agrária deveriam se preocupar em dar terra para o povo trabalhar e não reprimir os camponeses como se fossem criminosos. Parece ironia, mas em relação a repressão a luta pela terra, o Incra tem sido pior que os latifundiários.
Por fim queremos afirmar que não vamos aceitar ser mais uma vez enrolados e enganados. Exigimos que o Incra respeite a organização interna da área. Exigimos que o corte da terra seja respeitado, sendo 296 lotes de 8 alqueires mais 4 alqueires de reserva em bloco (Sem contar as terras da fazenda Maranata e Nossa Senhora Aparecida que ainda não foram cortadas). Exigimos que todas as pessoas que hoje vivem e trabalham em cima de suas posses tenham direito de continuar em cima da terra produzindo. E exigimos que cesse qualquer intimidação por parte da polícia.
As famílias da área Zé Bentão só querem continuar trabalhando dignamente. Não queremos conflito, mas também não estamos dispostos a perder tudo o que conquistamos com muita luta, suor e sangue e por isso resistiremos a qualquer tentativa de despejo. E caso ocorra um conflito, o Incra, a ouvidoria agrária, o governo federal e estadual, e a polícia serão inteiramente responsáveis pelo que ocorrer de mal as famílias de camponeses.
O povo quer terra, não repressão!
Defender a posse pelos camponeses da fazenda Santa Elina!