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MS: Reintegrações de posse ameaça retomadas indígenas

Nós,
o Comitê de Solidariedade aos Povos Indígenas, viemos por meio desta nota
denunciar o iminente risco de despejo das retomadas, localizadas na TI Dourados
Amambaipegua I. A ordem de Reintegração de Posse, correndo desde agosto, visa
retirar de suas ocupações tradicionais cerca de 200 famílias e entregá-las aos
latifundiários. Tais retomadas estão divididas nos 9 tekohas (território sagrado para os Guarani Kaiowa) situados ao
entorno da aldeia Tey’i Kue, em Caarapó-MS.

A
TI Dourados Amambaipegua I é uma área identificada pelo Estado brasileiro,
contudo, o seu processo de demarcação está paralisado. Logo, como parte da luta
pela autodemarcação, os Guarani Kaiowa avançam nos últimos anos nas retomadas
de seus territórios. Um dos mais importantes tekoha é o Kunumi Poty Verá, sob
a fazenda Yvu, na qual os latifundiários investiram uma ação violenta contra os
indígenas da área, isto, desencadeou o Massacre de Caarapó, cujo as marcas
estão presentes na história de luta do povo da região. O Massacre consistiu em um
ataque de centenas de pistoleiros armados, que assassinaram o agente de saúde
Clodiodi de Souza e feriram diversos indígenas, sendo, pois, mulheres, idosos e
crianças. Alguns destes feridos permanecem em luta por suas vidas até hoje, uma
vez que ainda contém balas alojadas. Apesar da brutal investida dos
latifundiários, os indígenas não se intimidaram com a ação e avançaram com as
retomadas, dando como resposta ao latifúndio a ocupação dos 9 tekohas, sendo estas destacadas
trincheiras de combate da autodemarcação no sul do Mato Grosso do Sul.

Ao
longo destes três anos, foram muitos os ataques do latifúndio e seu bando
armado contra os Guarani Kaiowa, de maneira que usam de ameaças, cercos as
retomadas, tentativa de envenenamento, despejos e prisões para desmobilizar as
áreas, entretanto, as famílias em luta permanecem em seus territórios firmando
a resistência indígena. Parte significante deste processo foi o enfrentamento,
ocorrido em agosto de 2018, quando a Tropa de Choque foi enviada para despejar
o tekoha Guapoy, mesmo sem liminar de
Reintegração, ocasionando vários feridos e a prisão do ancião Ambrósio
Alcebíades, solto tempo depois.

Neste
mesmo período, ocorreu a prisão de Leonardo de Souza, pai de Clodiodi. Sob a
absurda acusação de “tortura de policiais, cárcere privado qualificado,
roubo qualificado, sequestro, dano qualificado e corrupção de menores”,
Leonardo foi preso em dezembro de 2018, pela Força Nacional, em uma operação
degradante e vexatória para seu povo. Estampando a resposta do velho Estado: matam o filho e prendem o pai! Enquanto
isso, os mandantes e executores do Massacre de Caarapó continuam soltos,
mostrando a impunidade de velho Estado e a quem estão servindo.

Portanto,
com a atual ordem de Reintegração de Posse, os ataques do latifúndio tendem a
aumentar, visto que já está declarada a guerra de Bolsonaro contra aqueles que
lutam por sua terra. Em abril, Bolsonaro defendeu para os cabeças do
agronegócio que os assassinatos cometidos pelos latifundiários, contra quem for
acusado de ‘invadir terras’, não sejam condenáveis, além de prometer uma lei a
qual caracteriza a luta pela terra como terrorista. Tempo depois, o
ministro-chefe do GSI, general Augusto Heleno, defendeu a revisão de todas as
Terras Indígenas, utilizando-se da alegação de fraudes nos processos de demarcação.

Questionar
a ocupação de um território pelas nações originárias, que resiste há 519 anos a
destruição de suas culturas e a espoliação das terras que sempre viveram,
significa não só uma tomada de posição clara pelo latifúndio, e seu modo de
subjugação nacional, como também, uma declaração de guerra contra aqueles que
sobrevivem no seu pedaço de chão.

Tratar
desta forma indígenas e camponeses não é novidade, é marca histórica daqueles
que ocupam a gerência do velho Estado. O que há de novo é a veemência de
Bolsonaro em proclamar o terror latifundiário no campo, logo, sua saída para o
problema agrário nacional é afogar em sangue esta luta. Mas, com a mesma
veemência irá fracassar em seu propósito! As nações indígenas, desde a chegada
dos colonizadores, não deixaram de lutar um dia sequer. É esse o caminho
reafirmado todos os dias pelo povo Guarani Kaiowa em suas retomadas. Assim como
todos guerreiros que tombaram, o sangue de Clodiodi germinará a semente da
autodemarcação e autodeterminação dos povos tradicionais.

O
Comitê de Solidariedade aos Povos Indígenas conclama a todos os lutadores e
apoiadores da luta pela terra a denunciarem mais esta investida do latifúndio
contra o povo Guarani Kaiowa.

Abaixo
aos despejos das retomadas indígenas!

Terra
para quem nela vive e trabalha!

Clodiodi Vive! Leonardo Livre!

Comitê de Solidariedade aos Povos Indígenas


Referencias:

https://anovademocracia.com.br/no-190/7037-massacre-de-caarapo-um-ano-de-impunidade-e-resistencia

https://anovademocracia.com.br/noticias/10039-ms-forca-nacional-prende-indigena-e-humilha-sua-familia

https://anovademocracia.com.br/noticias/8554-ms-guarani-e-kaiowa-resistirao-a-tentativa-de-despejo-em-caarapo

https://cimi.org.br/2018/08/anciao-guarani-kaiowa-segue-detido-apos-acao-truculenta-da-policia-em-caarapo/