LCP presta homenagem a camponeses assassinados

No dia em que completou um mês dos assassinatos dos camponeses Élcio Machado e Gilson Teixeira Gonçalves a LCP – Liga dos Camponeses Pobres de Rondônia e Amazônia Ocidental e o Cebraspo – Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos realizaram um ato na cidade de Jaru.

Estiveram presentes o Codevise – Comitê de Defesa das Vítimas de Santa Elina, LCP do Pará e Tocantins, Comissão Pastoral da Terra, Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Jaru, Ato contou com participantes de várias áreasComitê Popular de Lutas, Comitê de Defesa Da Revolução Agrária e dos Direitos do Povo, Movimento Feminino Popular, Diretório Central dos Estudantes da Unir, professores, apoiadores e camponeses das áreas Raio do Sol, Canaã, Rio Alto, Jacinópolis, Flor do Amazonas e das cidades Theobroma, Jaru, Anari e Cujubim. Ao todo participaram mais de 100 pessoas.

Também foram prestadas homenagens aos camponeses Val e Luiz Lopes assassinados também em 2009.  Luiz Lopes era uma liderança histórica no sul do Pará e sua morte foi parte de uma série de outros 12 assassinatos de camponeses e lideranças que estiveram no acampamento Forkilha e que foram brutalmente despejados e torturados pela operação “Paz no campo” coordenada pelo governo de Ana Júlia Carepa (PT).

Outro homenageado foi João Pereira de Sá ativista antigo da luta camponesa em Rondônia que faleceu por problemas de saúde em Palmares do Oeste.

Luis Lopes, Seu João e Val também foram homenageados

Ato responsabiliza Ouvidoria Agrária pela morte de camponeses

Ouvidor Gercino é cúmplice dos assassinatos de Élcio e GilsonNo ato os participantes denunciaram as mortes ocorridas em Rondônia e a cumplicidade do Incra e Ouvidoria Agrária, em especial do Ouvidor Gercino José da Silva Filho, com os latifundiários da região. Também denunciaram o aumento do número de mortes no campo na região amazônica, durante a gerência Lula PT que segundo dados da CPT foi 157%  maior do que na gerência FHC. Dados que na realidade podem ser maiores, pois muitos assassinatos em conflitos pela terra não foram registrados.

Lideranças do acampamento Flor do Amazonas denunciaram o assassinato do camponês Gildézio Alves Borges  ocorrido dia 29 de dezembro. Segundo informações o responsável teria sido um latifundiário da região de Candeias conhecido como “Metralha”.

É importante ressaltar que passado três meses dos assassinatos nenhuma providência foi tomada pelas autoridades no sentido de punir os responsáveis ou cortar as terras para as famílias acampadas. Pelo contrário, uma semana após os assassinatos a Polícia Militar deteve 12 camponeses do acampamento Rio Alto na delegacia de Buritis onde foram interrogados e ameaçados. Também em Jaru na semana de preparação do ato policiais civis estiveram por três vezes na sede da LCP tentando intimidar camponeses e coordenadores.

Homenagens e passeata

Durante a solenidade de homenagens familiares e amigos se emocionaram ao relembrar a vida dos camponeses Luiz Lopes, João, Val, especialmente Élcio e Gilson pela forma brutal com que foram mortos. Foram lidos textos que resgataram suas origens, participação na luta, seus exemplos de dedicação a causa do povo e o heroísmo com que enfrentaram o latifúndio assassino e seus bandos armados.

O pai de Élcio fala durante homenagemOs familiares e amigos dos camponeses homenageados receberam um ramalhete de flores e um quadro simbolizando o sentimento de todos ali presentes. Manifestação nas ruas de JaruOutro momento importante foi o juramento da LCP onde os presentes reafirmaram o compromisso de seguir firmes na luta pela terra e defender os direitos do povo, sonhos de todos e dos camponeses Élcio, Gilson, Luiz Lopes, João e Val.

Após as homenagens foi realizada uma manifestação pelas principais ruas de Jaru. Os manifestantes pararam por uns minutos na rodoviária dos colonos, local onde se concentra a população rural de várias linhas. Participantes do ato falaram sobre a homenagem e distribuíram centenas de panfletos denunciando o martírio de Élcio e Gilson. Durante a manifestação trabalhadores do comércio e populares pararam para ver, ouvir e ler o panfleto.

Camponeses retomam as terras

No dia 16 de janeiro 40 famílias se reorganizaram e entraram de novo nas terras do PA Rio Alto. Plantaram coletivamente uma horta de 1 hectare e uma roça de mandioca de 1 alqueire.

Manifestação nas ruas de JaruO plano das famílias é roçar e derrubar coletivamente pelo menos 1 alqueire em cada lote e retomar o corte popular das terras, que já tem 120 lotes divididos. A decisão é mudar para cima dos lotes o mais rápido possível. Algumas mães se revezam no cuidado com as crianças para elas trabalharem com mais tranquilidade.

Os camponeses estão muito animados e a mobilização de novas famílias para acampar está a pleno vapor! Uma camponesa resumiu a vontade de todos: “Antes a gente queria só uma parte das terras, agora, depois da morte dos nossos companheiros, queremos a terra toda. É uma questão de honra para nós!”. A morte de Élcio e Gilson não foi em vão, e o maior sonho deles segue sendo construído pelos camponeses.

Gilson Teixeira GonçalvesGilson Teixeira Gonçalves nasceu em Corumbiara onde passou a infância no sítio dos avôs. Quando adolescente seguiu o mesmo caminho de milhares camponeses sem terra em todo o Brasil, para sobreviver foi obrigado a trabalhar nas fazendas da região. Trabalhou como vaqueiro, serrador e braçal.

Após alguns anos foi para o Mato Grosso, onde viveu 2 anos em Colniza ajudando sua mãe no sítio.

Quando retornou a Corumbiara conheceu a LCP através de seu tio que havia participado na batalha de Santa Elina. Devido às dificuldades de conquistar seu pedaço de terra naquela região mudou para União Bandeirantes junto com seu pai. Logo entrou para o acampamento Nova Conquista onde foi um dos coordenadores.

Após muita luta teve de sair de Bandeirantes devido às perseguições e ameaças do latifundiário Adaildo Araújo da Silva, seus bandos armados e grupos de extermínio da polícia militar. Continuou sua militância em Jacinópolis, onde se casou e conseguiu seu tão sonhado pedaço de terra.

Tinha como característica a coragem e disposição de lutar, mesmo doente de malária  andava dezenas de quilômetros para cumprir as tarefas. Em Jacinópolis foi um dos ativistas que assumiu a tarefa de vender o Jornal Resistência Camponesa, sendo o que mais se destacou nesta atividade, vendeu 30 jornais só numa tarde!

Participou da atividade realizada pela IAPL – Associação Internacional de Advogados do Povo em dezembro de 2008 em Jacinópolis. Nesta ocasião denunciou as atrocidades em Bandeirantes e a situação do seu pai Zé Vêncio que estava preso injustamente no presídio Urso Branco. Também participou na formação das Assembleias Populares e dos Comitês de Defesa da Revolução Agrária na região.

Já em 2009 ajudou a organizar o acampamento Oziel Luna, após o corte desta área se dispôs a ir para o acampamento Rio Alto contribuir com os companheiros com a sua experiência de luta e seu esforço.

Élcio Machado, o SábiaÉlcio Machado, o Sábia, assim como centenas de camponeses de Rondônia, nasceu no norte de Minas Gerais, onde seu pai trabalhava em fazendas para sustentar sua família. Vieram para Rondônia em busca de conseguir um pedaço de terra. Quando aqui chegaram moraram em Jaru onde trabalharam por algum tempo. Foi então que Élcio e sua família ingressaram numa mobilização da LCP para tomar terras na região da Barragem em Machadinho e finalmente conquistaram um pedaço de terra onde até hoje seu pai vive e trabalha junto de dezenas de camponeses.

Élcio retornou para Jaru onde trabalhou em serrarias, casou-se e teve 3 filhos. Junto com sua esposa decidiu buscar melhores condições de vida e lutar por um pedaço de terra. Participou do acampamento Conquista da União em Campo Novo em 2008. Esta área sofreu ataques de bandos armados a mando da família Catâneo e os camponeses foram expulsos das terras. Logo em seguida Élcio e outras famílias organizadas pela LCP iniciaram a mobilização para o acampamento Rio Alto do qual foi um dos principais coordenadores.

Durante os ataques ao acampamento em junho de 2009, Élcio junto com outros ativistas da LCP realizaram ampla denúncia em Porto Velho e participaram de um ato contra a criminalização da luta camponesa na Universidade Federal de Rondônia. Neste mesmo período realizaram denúncias em rádios e emissoras de TV de Porto Velho.

Em setembro participou de forma destacada da visita realizada pela Missão de Investigação e Solidariedade organizada pelo Cebraspo em Rio Pardo.

Histórico do Rio Alto

Élcio (Sabiá) distribuindo o Jornal Resistência Camponesa em Rio Pardo - Outubro de 2009O acampamento Rio Alto fica no Projeto de Assentamento Rio Alto, localizado na linha 36, há 25 Km de Buritis. Em 2004 o Incra cortou as terras em 730 lotes de 21 alqueires e colocou os marcos de cimento. Os poucos camponeses assentados foram expulsos por Dilson Caldato, que mandou arrancar as plaquetas de metal dos marcos. Na verdade, Caldato é testa de ferro de políticos e policiais que grilaram as terras da União destinadas à reforma agrária principalmente para roubar madeira através de planos de manejo ilegais.

Em junho de 2008 cerca de 50 famílias organizadas pela LCP retomaram as terras do P.A. Rio Alto e montaram o acampamento que já chegou a ter 150 pessoas.

Denúncias de ataques de bandos armados e policiais

28/01/09: as famílias foram despejadas por policiais militares de Buritis, Monte Negro e Ariquemes. Dois camponeses foram espancados com chutes e socos porque um deles soltou foguetes para alertar a chegada das viaturas na área. Policiais também roubaram uma bomba de passar fumaça contra o mosquito da malária.

14/02/09: policiais de Buritis efetuaram 4 disparos de arma de fogo, chegando a derrubar a bandeira da LCP hasteada na entrada do acampamento.

13/04/09: Caldato, empunhando uma pistola, e pistoleiros estiveram em um sítio vizinho ao acampamento e disseram ao dono: “– Se apoiar os acampados a coisa vai ficar feia pra você”

20/04/09: pistoleiros dispararam armas de diversos calibres durante a noite próximo ao acampamento.

A Ouvidora Agrária Regional Márcia do Nascimento Pereira esteve no acampamento junto com o Comando de Operações Especiais da PM para tentar desmobilizar as famílias. Irritada por não conseguir, disse que a terra era do Caldato e que se os camponeses não saíssem ela não se importaria se eles fossem mortos por pistoleiros. Em maio, a Operação Arco de Fogo apreendeu cargas de madeira ilegal na área, mas Caldato não foi multado.

24/06/09: uma comissão do acampamento reuniu-se com o Incra e com a PF em Porto Velho para confirmar se a área era mesmo do P.A. Rio Alto ou da fazenda de propriedade da família Caldato (Dilson e seu filho Jonis Orlando Caldato) que tem por base um tal Título Definitivo Ubirajara. Os mapas do Incra indicavam que as terras localizadas entre a linha 34 até a divisa com o P.A. Santa Cruz, no município de Buritis, pertencem ao P.A. Rio Alto com 730 lotes já divididos.

27/06/09: Caldato e 7 pistoleiros sequestraram dois jovens camponeses e os fizeram reféns. Durante todo dia foram espancados com golpes nas costas, chutes e cortes de canivetes nos braços. Durante a sessão de tortura Caldato dizia que iria matar e expulsar os acampados para não perder a madeira cortada e vendida ao irmão do vice-prefeito de Buritis por R$1,2 milhões.

07/07/09: cinco pistoleiros fizeram 3 camponeses reféns, amarraram suas mãos e os espancaram. Deixaram-nos na mata por mais de 6 horas.

08/07/09: policiais Militares e Civis de Buritis realizaram uma operação de busca e apreensão no acampamento, sem ordem judicial. Dois camponeses que estavam na estrada foram detidos.

12/07/09: 25 pistoleiros atacaram o acampamento com cerca de 120 pessoas. Deram dezenas de tiros, um jovem foi atingido na coxa; outros camponeses foram espancados. Os pistoleiros saquearam os barracos e levaram 5 motos, enxadas, foices, utensílios domésticos e objetos pessoais das famílias; depois atearam fogo no restante dos pertences. Os camponeses reconheceram o PM Zé Maria de Montenegro entre os pistoleiros, ele também esteve na operação de busca e apreensão.

Após denuncias a PM demorou mais de 2 horas para chegar ao local. Foram na sede da fazenda e disseram que não havia pistoleiros. Ao saírem deram uma rajada de tiros por cima das famílias e gritaram “não tem pistoleiro lá”. Na estrada, a viatura atropelou um camponês de 16 anos. Um policial desceu da viatura e ainda agrediu o jovem com chutes e socos na cabeça.

Na mesma semana pistoleiros andaram armados no ônibus da linha ameaçando os passageiros. Ameaçaram queimar a igreja caso recebessem acampados. Durante várias noites efetuaram disparos em frente a sítios vizinhos.

Dilson Caldato teria dito em Buritis que planejava contratar mais pistoleiros para destruir o acampamento e matar o advogado dos camponeses.

14/11/09: uma Toyota do Caldato com sete pistoleiros fortemente armados fecharam dois coordenadores em uma moto na estrada em frente ao acampamento. Os camponeses pularam da moto e se esconderam no mato. Os pistoleiros deram vários disparos, depois rasgaram o banco da moto e tentaram atear fogo.

03/12/09: Numa reunião do Incra em Porto Velho em que estavam presentes o comandante da PM de Buritis, o Incra, o latifundiário Dilson Caldato e o Ouvidor Agrário Gercino foi assinada a sentença de morte dos camponeses. Na ata da reunião Gercino alerta que os camponeses serão punidos por supostas ilegalidades, pede atuação da PM para defender a segurança da propriedade e cinicamente disse confiar que o fazendeiro não fará nada contra as famílias acampadas.

O comandante da PM de Buritis, Maj. Antônio Matias de Alcântara ainda lançou acusações infundadas e já desmascaradas há muito de que a LCP atua usando táticas de guerrilha, mas escondeu as denúncias de que policiais sobre seu comando adestram bandos armados da fazenda e receberam dinheiro para escoltar madeira ilegal para fora da área.

07/12/09: por volta das 14 horas, Élcio (Sabiá) e Gilson (Marcos) foram sequestrados na estrada que liga a área ao município de Buritis.

08/12/09: os corpos de Élcio e Gilson foram encontrados próximos a estrada, mas não havia sinais de sangue no local o que indica que foram assassinados em outro lugar.

Élcio tinha um hematoma no olho esquerdo, as unhas das mãos e tiras de pele das costas arrancadas provavelmente com alicate, a orelha esquerda decepada e um tiro no braço. Gilson teve quase todos os dentes superiores da frente quebrados, as unhas das mãos e tiras de pele das costas arrancadas. Eles foram executados com tiros de espingarda calibre 12 na nuca.

15/12/09: O Comando de Operações Especiais, Polícia Civil e Força Nacional realizaram uma operação no acampamento e sítios vizinhos. Foram utilizadas 12 viaturas.

Revistaram casas, em algumas quebraram portas e janelas. Perguntavam se tinha alguém na família que estava no acampamento. Uma senhora foi xingada de “velha safada, vagabunda”. Um senhor foi agredido com tapas no rosto e obrigado a se ajoelhar com armas apontadas pra sua cabeça. Outros camponeses foram empurrados com o cano de armas e agredidos com coronhadas. Apreenderam espingardas velhas de caça e o revólver do guarda de uma escola municipal. Quatro camponeses foram presos levados para delegacia de Buritis onde foram interrogados e liberados.

No acampamento os policiais já chegaram empurrando os camponeses com os canos das armas e apontando para mulheres e crianças. Uma senhora exigiu uma ordem judicial, um oficial da COE alegou que não precisavam mostrar.

Um rapaz foi algemado, uma mulher foi assediada por um policial, uma jovem foi ameaçada de ser levada ao conselho tutelar por ser menor de idade e estar grávida. Duas mulheres, um rapaz e cinco senhores também foram presos e levados à delegacia de Buritis para serem interrogados. Policiais ameaçaram levar dois destes camponeses detidos à sede da fazenda: “agora vocês vão ver o que é bom. Vamos afogar vocês na represa, vocês vão comer peixe.” Os policiais também ameaçaram voltar no acampamento com cães.

Na delegacia, os 12 camponeses detidos foram interrogados e fotografados um por um. Eles aproveitaram para denunciar os despejos, ataques, tiros e assassinatos que sofreram do Dilson Caldato e seus pistoleiros. Apesar disto, serão abertos inquéritos policiais contra estes 12 camponeses.

24/12/09: pistoleiros atiram na casa do sítio onde as famílias estavam acampadas temporariamente.

16/01/2010: quarenta famílias se reorganizaram e entraram de novo nas terras do PA Rio Alto. Plantaram uma horta coletiva e retomaram o corte popular das terras.

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